Apresentação
Qualquer empresa, independentemente do setor, tamanho e da localização geográfica, possui duas características em comum: uma estrutura, seja ela qual for, e uma cultura organizacional, construída ou emergente. Esses dois temas se relacionam ao definir quão hierarquizada será a estrutura da empresa e quantos níveis são necessários para comportar a gestão das diferentes áreas, além de determinar quais áreas são responsáveis por quais vertentes da companhia. Embora, a princípio, essas estruturas pareçam perenes e fundamentais, nem sempre são consideradas saudáveis ou desobstruídas, visto que isso requer uma cuidadosa organização de passagens de liderança, com atribuições e responsabilidades devidamente estabelecidas e, na medida do possível, sem sobreposições.
O livro "Pipeline da Liderança: O Desenvolvimento de Líderes como Diferencial Competitivo" [1], escrito por Ram Charan, Stephen Drotter e James Noel, apresenta um modelo para entender e desenvolver as diferentes camadas de liderança dentro de uma organização. Sugere que o desenvolvimento de lideranças eficazes requer um entendimento claro dos requisitos, desafios e transições associados a cada estágio da estrutura.
Esta estrutura, referida como "pipeline", assemelha-se a uma escada a ser escalada pelo profissional, composta por sete níveis. Em cada transição de nível, ocorre uma nova passagem de liderança, com cada nível sendo representado por um determinado cargo dentro de uma estrutura organizacional, conforme listado na Tabela 1.
Nível do Pipeline | Cargo Representativo | Descrição Breve |
---|---|---|
1. Autogerenciamento | Colaborador Individual | Foco no desenvolvimento de habilidades técnicas e profissionais, gerenciando o próprio tempo e tarefas. |
2. Gestor de Outros | Líder de Equipe / Supervisor | Responsável por gerenciar o trabalho de outros, motivar a equipe e avaliar o desempenho. |
3. Gestor de Gestores | Gerente de Gerentes / Diretor | Foca em orientar outros gerentes, desenvolvendo suas habilidades de liderança e estratégia. |
4. Gestor Funcional | Gerente de Departamento | Supervisiona uma área específica da empresa, como finanças ou marketing, implementando estratégias funcionais. |
5. Gestor de Negócios | Gerente Geral / CEO de Unidade de Negócios | Responsável pelo desempenho geral de uma unidade de negócios, incluindo lucratividade e estratégia de mercado. |
6. Gestor de Grupo | CEO de Grupo / Vice-Presidente | Gerencia múltiplas unidades de negócios ou regiões, assegurando a alinhamento estratégico e operacional. |
7. Gestor Corporativo | CEO / Presidente | Lidera a organização em seu conjunto, estabelecendo visão e estratégia corporativas, guiando a cultura organizacional. |
Tabela 1. Níveis do Pipeline e o cargo corresponde em uma companhia tradicional.
Os níveis e suas respectivas passagens de liderança são representados pelos autores através do pipeline ilustrado na figura referenciada abaixo. A Figura 1 mostra a progressão de cada etapa dentro da estrutura organizacional.
Nesta resenha, apresentarei de maneira resumida as ideias principais das duas primeiras passagens, além de ponderar algumas reflexões acerca da necessidade de cada uma ser bem estabelecida.
Do Colaborador Individual ao Nível Tático
A gestão empresarial há muito tempo estabelece que, genericamente, existem três níveis organizacionais nas empresas: o operacional, relacionado às tarefas do dia a dia e de curto prazo; o tático, que traduz diretrizes estratégicas em planos de ação de médio prazo; e o estratégico, definindo a direção geral e os objetivos de longo prazo da organização.
Bem delimitados e com um início claramente definido, profissionais no início de carreira passarão seus primeiros anos em uma organização como colaboradores individuais, normalmente encarregados de tarefas bem definidas, de curta duração e com objetivos muito bem determinados.
Neste momento, o profissional se encarregará de moldar suas habilidades, seu gerenciamento de tempo, e seus valores profissionais e outras características que demonstrem a capacidade de enfrentar responsabilidades e respeitar os valores da empresa. Uma vez comprovado que esses três pontos foram razoavelmente desenvolvidos, costumeiramente, esse profissional será promovido a líder ou gerente de primeiro nível.
"Para desenvolver líderes eficazes [...], as organizações precisam identificar precocemente candidatos a líder, oferecer-lhes tarefas para seu crescimento, dar-lhes feedback útil e aconselhá-los. (p.31)"
É importante ressaltar que a denominação do cargo pode variar de empresa para empresa — podendo ser líder, coordenador, gerente de primeiro nível, entre outros —, mas o essencial é enfatizar que, nessa primeira passagem de liderança, o novo líder estará gerenciando não apenas a si mesmo, mas também outras pessoas, o que exige uma transição comportamental e de habilidades e valores fundamentais para o sucesso no cargo.
Essas novas habilidades, descritas na Tabela 2, incluem planejar o trabalho, atribuir tarefas, motivar e avaliar criticamente o trabalho realizado por outras pessoas, ou seja, não apenas concluir o trabalho que lhe é atribuído, mas também ajudar os outros a alcançar um desempenho esperado. Neste ponto, é crucial que o trabalho gerencial seja valorizado, e não apenas tolerado, já que disponibilizar tempo para atender às demandas da equipe, esclarecer dúvidas, buscar contatos e diálogo junto a outras equipes, departamentos e fornecedores é fundamental para alcançar os objetivos de seus liderados e, consequentemente, determinar o seu sucesso.
Para os novos líderes, desapegar das tarefas e habilidades que os promoveram a um cargo de liderança pode ser desafiador, mas é necessário compreender que, neste novo nível, a obtenção dos resultados se dá por meio dos outros. O sucesso dos subordinados diretos reflete o sucesso do líder. Portanto, é essencial ver-se como um gestor, que define o trabalho a ser realizado e permite que este seja executado pelos seus subordinados, com confiança e responsabilidade, ensinando em vez de apenas corrigir erros, e mantendo-se próximo dos problemas e fracassos enfrentados pela equipe. Líderes nesta primeira passagem devem, acima de tudo, ser acessíveis e disponíveis, tanto física quanto emocionalmente, demonstrando que, por meio da acessibilidade, dominam o gerenciamento do próprio tempo.
Aspecto | Colaborador Individual | Gerente de Primeiro Nível |
---|---|---|
Habilidades | Domínio técnico/especializado, trabalho em equipe, desenvolvimento de relacionamentos para benefício pessoal, uso de ferramentas/processos | Planejamento, definição de cargo, seleção, delegação, monitoramento, coaching/feedback, avaliação de desempenho, motivação, comunicação, desenvolvimento de relacionamentos para benefício do departamento, aquisição de recursos |
Gestão de Tempo | Disciplina diária, cumprimento de prazos pessoais, administração do próprio tempo | Planejamento anual, disponibilidade para subordinados, definição de prioridades, tempo de comunicação com outros setores |
Valores Profissionais | Obtenção de resultados por proficiência, trabalho de alta qualidade, incorporação dos valores da empresa | Obtenção de resultados por meio dos outros, sucesso dos subordinados, sucesso do departamento, integridade |
Tabela 2. Características da Primeira Passagem de Liderança. (Adaptado de: CHARAN, Ram; DROTTER, Stephen; NOEL, James, 2011, p.64)
Quando líderes não possuem aptidão para o gerenciamento de tempo, enfrentam problemas no planejamento de tarefas e na determinação de prioridades para a equipe. Como resultado, estarão frequentemente sem tempo para auxiliar seus subordinados, o que obstruirá o fluxo de trabalho e, provavelmente, sobrecarregará tanto a si mesmos quanto aos demais. Da mesma forma, a ausência dos valores profissionais adequados leva a dificuldades em delegar atividades. Muitas vezes, esses líderes optam por realizar as tarefas por conta própria, negligenciando o planejamento. Isso resulta na falta de métodos gerenciais apropriados, tornando o ambiente de trabalho caótico e as relações e comunicações com outras equipes instáveis ou pouco eficazes.
A segunda passagem — de gestor de gestores — na liderança deve marcar uma transição completa do foco operacional para a gestão tática das equipes, além de priorizar o desenvolvimento dos novos líderes. Isso inclui mentoria, coaching, feedbacks contínuos e avaliações, além de delegar tarefas que os incentivem a praticar habilidades de gerenciamento de tempo adequadas à liderança de uma equipe.
Quando esses líderes são mal formados ou instruídos, certos problemas de gestão podem surgir, indicando que esses gerentes de gestores podem estar na posição errada ou ainda não desenvolveram plenamente suas habilidades, incluindo gestão de tempo e valores profissionais. Entre esses problemas, destacam-se a dificuldade de delegar, a má gestão do desempenho dos gerentes de primeiro nível, a incapacidade de desenvolver uma equipe forte — o que talvez seja o principal problema, especialmente quando há favoritismos, e falta de avaliação adequada por competência —, um foco excessivo na execução do trabalho, e a tendência a selecionar colaboradores que sejam clones de si próprios, em vez de optar por diversidade e competência.
Para que os gerentes de gestores executem seu papel com excelência, deveriam concentrar-se na seleção e treinamento de novos gerentes altamente competentes, exigir desses líderes a prestação de contas pelo trabalho gerencial realizado, alocar recursos entre as unidades conforme necessário, e administrar os limites entre cada unidade de acordo com a estrutura organizacional estabelecida.
Percebe-se que, no modelo de pipeline estabelecido pelos autores, não ocorre sobreposição de papéis. A clara definição de habilidades, gerenciamento de tempo e valores profissionais esperados em cada etapa do processo proporciona um ambiente propício ao surgimento de novas lideranças. Assim, elimina-se a necessidade de contratar exclusivamente profissionais notáveis, permitindo potencializar as lideranças internas para que executem seus papéis de forma adequada, sem competição entre líderes e liderados por uma mesma ação.
Finalmente, ao estabelecer os requisitos apropriados para os diferentes níveis de liderança, o processo de planejamento de sucessão é facilitado, reduzindo a tensão emocional para os novos líderes recém-promovidos. Como destacam os autores, "quando alguém pula etapas de liderança e é colocado em uma posição para a qual não possui as habilidades, o domínio do gerenciamento de tempo e os valores profissionais necessários, o impacto emocional é significativo. O modelo de pipeline torna o salto dessas etapas improvável."
Considerações
Estabelecer papéis em uma estrutura organizacional é sempre um desafio. Torna-se ainda mais difícil quando essas definições não são claras e objetivas, ou quando falta um plano formal de coaching e formação pelos níveis superiores, que, segundo os autores, seriam os responsáveis pela criação de sucessores. A ausência dessas definições cria lacunas no pipeline, levando a sobreposições de funções: a situação de gerentes realizando tarefas operacionais em vez de gerenciá-las é talvez o sintoma mais evidente do descuido com as habilidades necessárias, o gerenciamento de tempo e os valores profissionais requeridos para alcançar um desempenho excepcional no cargo.
Embora essa disfuncionalidade seja comum, combatê-la é fundamental. A formação de líderes nos primeiros níveis de uma estrutura organizacional, que atendam aos requisitos mencionados, é indispensável. Afinal, é nas camadas operacionais e táticas que todas as empresas, independentemente de seu tamanho e setor, fundamentam sua receita através do desenvolvimento de produtos e serviços. Além disso, esses níveis representam a porta de entrada para novos talentos, seja por meio de recrutamento ou de formação interna.
Finalmente, a adoção deste modelo representa um passo estratégico vital para as organizações que almejam não apenas manter sua competitividade em um mercado em constante evolução, mas também para garantir um legado de liderança forte e sustentável ao longo dos anos.